sábado, 17 de outubro de 2015

A IMPUNIDADE CONSAGRADA


Na última quinta-feira (15), morreu o coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, aos 83 anos. 

Ele comandou de 1970 a 1974 o DOI (Destacamento de Operações de Informações) do II Exército, em São Paulo que foi o principal local onde se praticou atos de tortura, desaparecimento e morte de cidadãos que resistiram à ditadura que durou vinte e um anos (1964 a 1985) neste país.

O seu nome está no relatório final da Comissão Nacional da Verdade que apontou 377 pessoas como responsáveis diretas ou indiretas pela prática de tortura e assassinatos. Não havia local onde se cometia mais crimes de lesa-humanidade quanto os agentes do Estado do DOI comandado por Ustra.

Todas as formas possíveis de violência contra presos políticos foram praticadas incluindo estupros e sequestros de crianças cujos pais estavam presos ou mortos acusados de serem terroristas e/ou subversivos. O DOI era conhecido como um campo de concentração devido às práticas nazistas. Não haviam câmaras de gás mas as execuções eram absolutamente violentas a ponto de fragmentos do corpo, como pedaços do cérebro, ficarem grudados às paredes. 

Existem inúmeras provas e depoimentos de que Ustra ordenava as sessões de tortura e participava delas.

O coronel escapou de ser punido pela justiça comprovando mais uma vez a falta de compromisso do Estado Brasileiro com a sua história bem como com a de defesa dos Direitos Humanos.  

A sua morte é um fato lamentável para os cidadãos conscientes da importância da democracia e da defesa da dignidade da pessoa humana.

Assim como ele, inúmeros outros também morreram ou ainda estão vivos e impunes. Casos como o do carrasco Ustra estimulam o retorno daquele período sombrio de maneira nefasta e irresponsável.

O processo civilizatório brasileiro não pode seguir permitindo a falta de punição a qualquer torturador que age em nome do Estado caso contrário estaremos fadados a nos reconhecermos como uma sociedade desumana, submissa e covarde além de um país omisso condenado a ignorar o respeito ao seu povo.

MANIFESTO CONTRA O IMPEACHMENT


A sociedade brasileira precisa reinventar a esperança

A proposta de impeachment implica sérios riscos à constitucionalidade democrática consolidada nos últimos 30 anos no Brasil. Representaria uma violação do princípio do Estado de Direito e da democracia representativa, declarado logo no art.1o. da Constituição Federal.

Na verdade, procura-se um pretexto para interromper o mandato da Presidente da República, sem qualquer base jurídica para tanto. O instrumento do impeachment não pode ser usado para se estabelecer um “pseudoparlamentarismo”. Goste-se ou não, o regime vigente, aprovado pela maioria do povo brasileiro, é o presidencialista. São as regras do presidencialismo que precisam vigorar por completo.

Impeachment foi feito para punir governantes que efetivamente cometeram crimes. A presidente Dilma Rousseff não cometeu qualquer crime. Impeachment é instrumento grave para proteger a democracia, não pode ser usado para ameaçá-la.
A democracia tem funcionado de maneira plena: prevalece a total liberdade de expressão e de reunião, sem nenhuma censura, todas as instituições de controle do governo e do Estado atuam sem qualquer ingerência do Executivo.

É isso que está em jogo na aventura do impeachment. Caso vitoriosa, abriria um período de vale tudo, em que já não estaria assegurado o fundamento do jogo democrático: respeito às regras de alternância no poder por meio de eleições livres e diretas.

Seria extraordinário retrocesso dentro do processo de consolidação da democracia representativa, que é certamente a principal conquista política que a sociedade brasileira construiu nos últimos trinta anos.

Os parlamentares brasileiros devem abandonar essa pretensão de remover presidente eleita sem que exista nenhuma prova direta, frontal de crime. O que vemos hoje é uma busca sôfrega de um fato ou de uma interpretação jurídica para justificar o impeachment. Esta busca incessante significa que não há nada claro. Como não se encontram fatos, busca-se agora interpretações jurídicas bizarras, nunca antes feitas neste país. Ora, não se faz impeachment com interpretações jurídicas inusitadas.

Nas últimas décadas, o Brasil atingiu um alto grau de visibilidade e respeito de outras nações assegurado por todas as administrações civis desde 1985. Graças a políticas de Estado realizadas com soberania e capacidade diplomática, na resolução pacifica dos conflitos, com participação intensa na comunidade internacional, na integração latino-americana, e na solidariedade efetiva com as populações que sofrem com guerras ou fome.

O processo de impeachment sem embasamento legal rigoroso de um governo eleito democraticamente causaria um dano irreparável à nossa reputação internacional e contribuiria para reforçar as forças mais conservadoras do campo internacional.

Não se trata de barrar um processo de impeachment, mas de aprofundar a consolidação democrática. Essa somente virá com a radicalização da democracia, a diminuição da violência, a derrota do racismo e dos preconceitos, na construção de uma sociedade onde todos tenham direito de se beneficiar com as riquezas produzidas no pais. A sociedade brasileira precisa reinventar a esperança.

Assinam, entre outros: Antonio Candido; Alfredo Bosi; Evaristo de Moraes Filho e Marco Luchesi, membros da Academia Brasileira de Letras; Andre Singer; o físico Rogério Cézar de Cerqueira Leite; Ecléa Bosi; Maria Herminia Tavares de Almeida; Silvia Caiuby; Emilia Viotti da Costa; Fabio Konder Comparato; Guilherme de Almeida, presidente Associação Nacional de Pós-Graduação em Direitos Humanos, ANDHEP; Maria Arminda do Nascimento Arruda; Gabriel Cohn; Amelia Cohn; Dalmo Dallari; Sueli Dallari; Fernando Morais; Marcio Pochman; Emir Sader; Walnice Galvão; José Luiz del Roio, membro do Fórum XXI e ex-senador da Itália; Luiz Felipe de Alencastro; Margarida Genevois e Marco Antônio Rodrigues Barbosa, ex-presidentes da Comissão Justiça e Paz de São Paulo; os cientistas políticos Cláudio Couto e Fernando Abrucio; Regina Morel; o biofísico Carlos Morel; Luiz Curi; Isabel Lustosa; José Sérgio Leite Lopes; Maria Victoria Benevides, da Faculdade de Educação da USP; Pedro Dallari; Marilena Chaui; Roberto Amaral e Paulo Sérgio Pinheiro.